Deise Maria Bourscheidt (UFFS), Elder Antonio Tomassevski (UFFS), Daniel Alberto Perozo Suárez (UnB)
INTRODUÇÃO E MOTIVAÇÃO PARA A PESQUISA
Os desastres naturais estão presentes em todas as regiões do Brasil. Apenas em 2020 aconteceram mais de 3800 desastres ambientais no Brasil, sendo em sua maioria aqueles de denominados como climatológicos, entre elas a Estiagem e Seca (SEDEC/MDR, 2023). Eles podem ser resultado de processos naturais, mas também de pressões exercidas pela exploração do ser humano sobre a natureza, incluindo aquela que resulta em crescimento econômico.
Uma resposta para a causa dos desastres pode ser dada pela ótica da Economia Ecológica. Os economistas ligados à Economia Ecológica têm apontado para a insustentabilidade de crescimento econômico ininterrupto. “Como a escala da economia mundial continua a crescer, a humanidade é cada vez mais confrontada com os limites biofísicos do planeta” (REZAI, STAGL, 2016, p. 1).
Para os economistas ecológicos o Ecossistema abriga o sistema econômico, e o oposto não é verdadeiro. “Capital e recursos naturais são essencialmente complementares” (ROMEIRO, 2010. p. 10) ou seja, a função de produção apresentada pela Economia Convencional, segundo a qual, recursos naturais, capital e trabalho podem ser alternados conforme a escassez de qualquer um deles, não se sustenta.
Pesquisas anteriores mostram uma relação de desastres com vulnerabilidades socioeconômicas e riscos. O Índice de Risco de Desastres no Brasil (DRIB), por exemplo, tenta avaliar a exposição a quatro tipos de desastres naturais: elevação do nível do mar, inundações, deslizamentos e secas. Ele considera em seu cálculo, tanto a vulnerabilidade social, quanto os fenômenos naturais. Para calcular o índice foram inseridos 34 indicadores, que representam a situação econômica social e ambiental das localidades (DE ALMEIDA; WELLE; BIRKMANN, 2016).
A Figura 2 mostra o Mapa do Risco de Desastres para os 5.565 municípios brasileiros, combinando à exposição aos desastres com a vulnerabilidade dos municípios.
Interpreta-se como menor grau de risco os municípios em verde e escuro, e maior grau de risco os municípios na cor vermelha, sendo as outras cores intermediárias. Entre os vinte municípios que apresentaram maior grau de risco, treze pertencem a região Norte e seis pertencem à região Nordeste. Se o foco for apenas a vulnerabilidade, 80,23% dos municípios que apresentam vulnerabilidade muito alta se concentram nestas regiões. Isso reflete os padrões de pobreza e desigualdade entre as grandes regiões Norte/Sul, e implica em maior dificuldade tanto para evitar os desastres, como para a recuperação pós desastre (DE ALMEIDA; WELLE; BIRKMANN, 2016).
Estes desastres distribuem-se de maneira desigual pelo Brasil, e por isso, seus impactos, como os danos humanos, e também os prejuízos monetários decorrentes, precisam ser averiguados regionalmente. Deste modo, este trabalho propôs apresentar um panorama geral sobre os desastres naturais que ocorreram nos Estados da Amazônia entre 1991 e 2020 e estabelecer uma relação com as bases da Economia Ecológica.
ECONOMIA ECOLÓGICA: FATORES ESSENCIAIS
São muitas as diferenças básicas entre a visão defendida pelos Economistas Ecológicos e pelos Economistas Ambientais. Se a semelhança é o reconhecimento da importância da problemática ambiental do ponto de vista econômico, a diferença fundamental perpassa a questão do que vem primeiro: o planeta ou a Economia.
Do ponto de vista da Economia Ecológica, o meio ambiente representa um limite absoluto à expansão da economia, que lhe é um subsistema. No entanto, se por definição um subsistema não pode ser maior que o sistema que o contém, seu tamanho em relação ao todo não tem por limite máximo o sistema, mas sua capacidade de carga (carrying capacity) dada por limiares de resiliência ecossistêmica (ROMEIRO 2012, 2012, P.78).
A Economia Ecológica questiona não só a infinitude do crescimento econômico, mas também o modo como ele se dá e a capacidade de satisfação dos desejos e necessidades que ele supostamente proporciona. E para isto pode ser utilizada a analogia do navio e sua carga.
“A Economia Ecológica parte do princípio de que o nosso objetivo não é apenas o de carregar o navio até o limite, mas manter livres algumas áreas do navio para o nosso conforto e usufruto, para nos deliciarmos com a beleza extraordinária da sua construção, e de mantê-lo em excelentes condições para as gerações futuras” (Daly e Farley, 2010, p. 32).
Em síntese, enquanto a Economia Ambiental resulta de uma incorporação da temática ambiental pela Economia Convencional (neoclássica). Deste modo, os pressupostos neoclássicos passam a valer também na perspectiva ambiental, sendo que os recursos naturais são passíveis de substituição dentro da função de produção o que torna o crescimento econômico ilimitado. Já a Economia Ecológica compreende a limitação do planeta em termos de recursos escassos, e também de capacidade de absorção dos resíduos e questiona a resiliência do planeta.
MÉTODO
Para alcançar o objetivo foi realizado um levantamento e análise de dados, complementados por uma breve revisão de literatura de modo a observar a relação entre desastres e Economia Ecológica. O levantamento de dados foi realizado pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil – Sedec/MDR, que disponibilizam os dado sobre desastres por município, classificando-os por grupo e por tipo de desastres abrangendo dados entre 1991 e 2021. Esta pesquisa focou nos dados compreendidos entre 1991 e 2020.
Os grupos de desastres são divididos em Climatológico, Meteorológico, Hidrológico e Outros. Entre os desastres Climatológicos estão os do tipo Estiagem e Seca, Incêndios Florestais, e Ondas de Calor e baixa Umidade. Como meteorológicos estão classificados os Vendavais e Ciclones, os Tornados, as Ondas de Frio, e o Granizo. Nos desastres hidrológicos incluem-se as inundações, as chuvas intensas, os alagamentos, as enxurradas e os movimentos de massas (SEDEC/MDR, 2023).
Além de realizar uma análise descritiva dos desastres na região amazônica, a revisão de literatura permitirá sugerir alguns insights sobre a relação entre desastres e a visão da Economia Ecológica.
RESULTADOS
Análise Descritiva dos Desastres

A Figura 1 mostra o número de ocorrências de desastres naturais em cada uma das UFs pertencentes a região amazônica entre os anos de 1991 e 2020. Neste período foram registrados 4456 desastres e destes, quase 30% apenas no estado do Mato Grosso e pouco mais de 24% no Pará, como pode ser visualizado na Figura 2.

Figura 2: número de desastres por UF pertencente à região amazônica entre 1991-2020.
Quando observados os prejuízos monetários decorrentes destes desastres, verifica-se que o estado do Mato Grosso sofreu mais com prejuízos per capita, passando de R$ 3470 por habitante durante o período todo. Enquanto isso no Pará a perda foi de menos de 10% do montante perdido pelo MT, registrando um prejuízo de R$ 340,08 por pessoa (Figura 3).

A Figura 4 mostra os valores agregados ano a ano entre 1991 e 2020. Observa-se uma tendência de aumento no número de desastres, sendo que os prejuízos totais tiveram dois picos: um em 2005, quando o valor ficou acima de R$ 3.445 bilhões e um em 2014, excedendo os R$ 5 bilhões de reais. Depois disso, apesar de o número de ocorrências de desastres continuar aumentando, os valores monetários anuais perdidos tiveram uma tendência de queda.

Figura 4 Prejuízos Anuais Totais e Número de desastres entre 1991 e 2020 na região amazônica
Do total de desastres que aconteceram, quase 63 % se classificam no grupo de desastres hidrológicos, como pode ser visto na Figura 5. Isso faz muito sentido, dado que a Floresta Amazônica tem como característica a presença de alta umidade. Ambos os estados registraram a ocorrência de enxurradas, as inundações foram recorrentes no estado do Amazonas, e os alagamentos prevaleceram no Estado do Pará (cerca de 30%).

Figura 5 – Desastres ambientais por Grupo (1991-2020)
Como as UFs que integram a região amazônica são bastante diversas, a estiagem e seca também está presente, com destaque para o estado do Maranhão. Os incêndios florestais. predominaram no Estado do Mato Grosso, local onde a principal atividade econômica é o agronegócio. Entre 2002 e 2020 houve um crescimento médio do PIB do Mato Grosso de mais de 5,6% ao ano, bem acima da média nacional (SEPLAG). Ao mesmo tempo, o estado foi o responsável por mais de 22% das áreas queimadas no período compreendido entre 2000 e 2019 sendo que as áreas mais afetadas foram aquelas compostas por formações naturais não florestais, formações savânicas e áreas agropecuárias (MAPBIOMAS, ICV, 2020).
Desastres Ambientais e Economia Ecológica: algumas contribuições Quando se fala em mitigação de desastres na perspectiva da Economia Ecológica é importante frisar a impossibilidade de substituição total e completa de boa parte dos fatores que são exauridos nos desastres. Um exemplo é a mata nativa que se vai quando ocorrem os incêndios florestais, e cujas consequências vão muito além, levando a perda da biodiversidade brasileira, cujos benefícios são muitas vezes insubstituíveis.
Uma simples análise custo benefício não dá conta de mensurar a perda que a falta de determinadas espécies, como de populações de abelhas que morrem em consequências de desastres, por exemplo, pode causar. Além da perda econômica decorrente da redução da polinização, no limite pode resultar na falta de alimentos. E isto se relaciona com o que defende a Economia Ecológica, pois o crescimento econômico a qualquer custo é inviável e pode levar a consequências irreversíveis.
A prática do desmatamento que costuma ser sucedida por queimadas e causa danos graves para os ecossistemas não é mais necessária para aumentar a produção. Focar em melhoria da produtividade e especialmente na diversificação da produção em pequenas propriedades, nos sistemas agroflorestais e na agricultura orgânica, tem se mostrado mais eficiente e ambas são práticas defendidas pela Economia Ecológica.
Deste modo, é importante frisar a necessidade de desenvolver políticas públicas voltadas à adaptação e à mitigação de desastres, que estejam alinhadas aos pilares da Economia Ecológica, ou seja, que não apenas tentem alocar ou então substituir recursos, mas sim que incentivem o uso consciente de recursos, não ultrapassando o limite planetário.
Se o desastre tem causa relacionada ao crescimento econômico por exemplo, infere-se que talvez aquele local tenha excedido a pressão ecossistêmica possível. É função dos defensores da Economia Ecológica, estudar a fundo as situações em que a causa da mudança climática, do desastre ambiental é consequência da pressão humana e intervir utilizando as bases nas quais acreditam.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DALY, H.; FARLEY, J. Economia Ecológica. São Paulo: Annablume Cidadania e Meio Ambiente, 2016. (Introdução, Caps. 1 até 3).
DE ALMEIDA, L. Q.; WELLE, T.; BIRKMANN, J. Disaster risk indicators in Brazil: A proposal based on the world risk index. International Journal of Disaster Risk Reduction, v. 17, p. 251–272, 2016.
EMBRAPA. Sistemas Agrícolas Sustentáveis. Disponível em: Megatendência – Intensificação e sustentabilidade – Portal Embrapa Acesso em 19 jun. 2013.
INSTITUTO CENTRO DE VIDA Balanço dos incêndios em Mato Grosso em 2020 Disponível em: Balanço dos incêndios em Mato Grosso em 2020 (icv.org.br) Acesso em 19 de jun. 2023.
MAY, P. H.; LUSTOSA, M. C.; VINHA, V. Economia do Meio Ambiente – Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Campus, 2003. (Cap. 1).
MAP BIOMAS BRASIL Disponível em: Mapbiomas Brasil Acesso em 19 jun. 2023.
REZAI, Armon; STAGL, Sigrid. Ecological Macroeconomics: Introduction and Review Working Paper Series Nr. 9/Year 2/2016.
ROMEIRO, A. R. Desenvolvimento sustentável: uma perspectiva econômico ecológica. Estudos avançados, v. 26, p. 65-92, 2012.
SEDEC/MDR Atlas Digital de Desastres do Brasil Disponível em: Atlas (mdr.gov.br) Acesso em 20 jun. 2023.
SEPLAG PIB – Produto Interno Bruto – Mato Grosso Disponível: Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão | Governo do Estado de Mato Grosso (seplag.mt.gov.br) Acesso: 19 de jun. 2023.
