Desmatamento da Amazônia causa forte aquecimento regional

Por:Eduardo W. Nádegas; Jéssica C. A. Padeiro; Francisco G. Silva Bezerra ; Ana P. D. Aguiar e Dominick V. Spracklen

Significado

O desmatamento tropical aquece o clima com impactos negativos sobre as pessoas que vivem nas proximidades. A maioria dos estudos anteriores se concentrou no aquecimento local causado pelo desmatamento e pouco se sabe sobre como o desmatamento impacta as áreas circundantes. Nosso estudo usou dados de satélite para mostrar que o desmatamento na Amazônia causou um aquecimento substancial a até 100 km de distância do local da perda de floresta. Mostramos que esse aquecimento não local aumentou o aquecimento induzido pelo desmatamento em um fator de quatro. Estimamos que a redução do desmatamento na Amazônia brasileira poderia reduzir o aquecimento futuro no sul da Amazônia em 0,56 °C. Esses resultados destacam o papel do desmatamento nas mudanças climáticas regionais e enfatizam a importância da redução do desmatamento para a adaptação climática e resiliência na Amazônia.

Resumo

O desmatamento tropical impacta o clima por meio de complexas interações terra-atmosfera, causando aquecimento local e regional. No entanto, embora os impactos do desmatamento sobre a temperatura local sejam bem compreendidos, a resposta regional (não local) é pouco quantificada. Aqui, usamos observações de sensoriamento remoto da perda de floresta e da temperatura da superfície da terra durante o período de 2001 a 2020 para demonstrar que o desmatamento da Amazônia causou forte aquecimento a distâncias de até 100 km de distância da perda florestal. Aplicamos uma abordagem de aprendizado de máquina para mostrar que o aquecimento não local devido à perda de floresta em escalas de comprimento de 2 a 100 km aumenta o aquecimento devido ao desmatamento em mais de um fator 4, de 0,16 K a 0,71 K para cada 10 pontos percentuais de perda florestal. Estimamos que o rápido desmatamento futuro sob um forte cenário de desigualdade poderia causar um aquecimento da estação seca de 0,96 K em todo o estado de Mato Grosso, no sul do Brasil, durante o período de 2020 a 2050. A redução do desmatamento poderia reduzir o aquecimento futuro causado pela perda de floresta para 0,4 K. Nossos resultados demonstram a contribuição do desmatamento tropical para o aquecimento climático regional e o potencial de redução do desmatamento para proporcionar adaptação climática regional e resiliência com implicações importantes para o manejo sustentável da Amazônia.

Amazônia havia sido desmatada em 2021, com taxas de desmatamento acelerando nos últimos anos (2526). Um cenário de desmatamento contínuo da Amazônia estimou que até 40% da bacia poderia ser desmatada até 2050 (27). Dada a extensão da mudança da cobertura da terra em toda a Amazônia, as respostas locais e não locais de temperatura à perda de floresta podem representar um mecanismo importante para moldar os climas locais e regionais.Combinamos uma série de conjuntos de dados de sensoriamento remoto para quantificar e prever mudanças na temperatura da superfície da estação seca devido à perda de cobertura florestal em toda a Amazônia em escalas de comprimento variadas. Um estudo anterior (21) avaliou como o aquecimento em áreas não perturbadas da floresta amazônica foi impactado pela quantidade de perda florestal não local. Nosso estudo se concentra em áreas que experimentam perda florestal e visa entender como as mudanças de temperatura em escala local dependem da extensão da perda florestal local e não local. Calculamos a mudança nas observações de sensoriamento remoto da temperatura da superfície terrestre em n = ~3,7 milhões de locais (a cada 1 km

2 em extensão) em toda a Amazônia entre 2001 e 2020. Usando observações de sensoriamento remoto da fração florestal durante o mesmo período, exploramos como o aquecimento da perda florestal dependia da extensão da perda florestal local e não local. Em seguida, usamos uma abordagem de aprendizado de máquina para isolar ainda mais os efeitos locais e não locais da perda florestal. Finalmente, usamos esse modelo para fazer a primeira previsão de como a resposta à temperatura depende da perda de floresta local e não local em toda a Amazônia.

Resultados e Discussão

Perda Florestal e Mudança de Temperatura Superficial.

A figura 1 mostra a perda de floresta amazônica e a correspondente estação seca (definida como a mais seca 3 mo por pixel) da mudança de temperatura da superfície terrestre (ΔT) ao longo de 2001 a 2020. A perda de floresta e ΔT mostram padrões espaciais semelhantes, com aquecimento mais forte sobre as regiões de perda florestal, particularmente ao longo do “arco do desmatamento” ao longo do sul da Amazônia. O aquecimento excede 5 K sobre regiões de perda florestal extensiva, com aquecimento mais forte sobre regiões com perda florestal mais extensa (Fig. 1B). Em toda a bacia Amazônica (n = 3,7 milhões), a mediana e a médiade Δ T foram de 0,48 e 0,6 K, respectivamente (fig. 1B). Em todo o bioma amazônico brasileiro, a mediana e a média deΔ T observadas foram maiores em 0,58 e 0,78 K, respectivamente (fig. 1B).

Perda florestal e mudança de temperatura da superfície durante 2001 a 2020. (A) Perda de pontos percentuais (%) na fração florestal. (B) Variação da temperatura superficial (ΔT, Kelvin) do mês mais seco. A variação da fração florestal e ΔT ao longo de 2001 a 2020 é calculada como a diferença entre a média dos primeiros 3 anos e dos últimos 3 anos do período de estudo (ou seja, 2001-2003 versus 2018-2020). Dados são mostrados para a bacia amazônica com o limite do bioma amazônico brasileiro também mostrado.

Δt observado em função da perda florestal em escala local e regional.

A figura 2 mostra ΔT observado para quantidades variáveis de perda florestal local e regional. Em locais com pouca ou nenhuma perda florestal (<10 pontos percentuais de perda florestal), a mediana ΔT é de 0,3 K, o que consideramos uma taxa de fundo. Locais com 10% a 20% de perda de floresta local, mas pouca perda de floresta regional (ou seja, <10 pontos percentuais de perda florestal em escalas regionais de 2 a 100 km), experimentam um aquecimento médio de 0,6 K, ou o dobro da taxa de fundo. Locais com 40-50% de floresta local, mas pouca perda de floresta regional, experimentam um aquecimento médio de 1,3 K, mais do que o quádruplo da taxa de fundo. O aquecimento sobre locais com perda de floresta local e regional é ainda maior. Locais com 10% a 20% de perda de floresta local e 10% a 20% de perda de floresta regional em escalas de 2 a 10 km experimentam um aquecimento de 0,9 K, o triplo da taxa de fundo. Quando a perda de floresta local e regional é de 40 a 50%, o aquecimento médio é 6 vezes a taxa de fundo (1,9 K). Quando a escala regional de perda florestal se estende até 100 km, o aquecimento é de 3,5 vezes (1,1 K) a 14 vezes (4,4 K) maior para 10-20% e 40-50% de perda florestal, respectivamente. O aquecimento superior a 4 K observado em regiões com forte perda de floresta local e regional está no limite superior do relatado em estudos anteriores de desmatamento tropical (513). O aquecimento de 3 K na estação seca tem sido relatado para regiões de desmatamento em larga escala no sul da Amazônia (16). Em conjunto, isso sugere que a perda de floresta em grande escala leva a um aquecimento substancialmente maior.

Mudança na temperatura da superfície da estação seca observada (ΔT, Kelvin) em função da perda de floresta em diferentes escalas de comprimento. ΔT é mostrado da esquerda para a direita: Perda florestal local (0–2 km) apenas (ou seja, menos <10% de perda florestal em escalas regionais de 2 a 100 km), perda florestal local mais regional em 2–10 km (ou seja, menos <10% de perda florestal em escalas regionais de 10 a 100 km) e perda florestal local mais regional em 2–100 km. Os valores centrais rotulados são a mediana da distribuição. A figura se restringe a exibir a perda florestal <50%.

IMPACTO

Pessoas em toda a Amazônia ao estresse térmico extremo (34). O aumento das temperaturas reduzirá a produtividade humana (35) e aumentará a mortalidade humana por todas as causas (36) para comunidades já marginalizadas. O aumento das temperaturas também afetará a pecuária e reduzirá a produtividade das culturas (37), exacerbado pelas reduções de chuvas induzidas pelo desmatamento (3839). O aumento da temperatura regional causado pelo desmatamento também afetará o armazenamento de carbono da floresta remanescente (40-42) e aumentará o risco de incêndio, com a névoa resultante tendo consequências adicionais para a saúde humana (43).

Em 2020, o desmatamento da Amazônia atingiu a maior taxa da última década (44), com consequente perda de biodiversidade e emissões substanciais de carbono (45). Nossa análise mostra que o controle do desmatamento futuro na Amazônia reduziria o aquecimento futuro, particularmente para os estados do sul de Rondônia e Mato Grosso, com importantes benefícios sociais e econômicos em toda a região. A degradação florestal, onde as florestas foram seletivamente derrubadas ou sofreram incêndio, impacta grandes áreas da Amazônia (46), contribuindo substancialmente para as emissões de carbono (4748). A evapotranspiração em florestas degradadas pode ser até 34% menor em comparação com florestas intactas (49), com prováveis consequências para o clima regional. A recuperação de florestas secundárias e degradadas pode atuar como sumidouro de carbono (50) e pode oferecer resfriamento local e regional adicional por meio de efeitos biofísicos. Trabalhos futuros são necessários para analisar os impactos climáticos regionais da degradação florestal e do rebrotamento de florestas secundárias e degradadas (51). Identificar opções para o desenvolvimento sustentável da Amazônia sem grandes desmatamentos ou degradação futura é crucial (52) para apoiar a adaptação climática e a resiliência da região.

NOTA : foi transcristo parte do artigo. Leia o artigo na integra aqui em PNAS.

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