Por Marcelo Augusto Rasteiro
Presidente da SBE
A tragédia de Mariana ainda deve continuar viva na sociedade por um bom tempo
O horror exposto faz com que a maioria queira punição e até vingança das mineradoras culpadas, parte politiza a questão atacando a situação por não tomar ações rápidas e enérgicas ou a dita oposição pela privatização e concessão de licenças, as vezes trazendo à tona o financiamento de campanha.
Tudo isso é justo, as mineradoras devem ser punidas e assumir o ônus de uma reparação, ou melhor, remediação do ocorrido, também devemos identificar as pessoas responsáveis por evitar a tragédia e que por negligência ou qualquer outro motivo não o fizeram.
Mas isso só não basta. Pequenas tragédias estão assolando o Brasil todos os dias e não conseguem comover a grande massa. Não tenho dúvida de que todos os dias espécies são extintas, o patrimônio cultural e geológico é atacado e pessoas morrem pela piora nas condições ambientais, mas como ocorre em muitos eventos menores, ganham no máximo uma nota de rodapé que logo é esquecida.
Os problemas são muitos, mas um deles está intimamente ligado a esta e as milhares de pequenas tragédias ambientais diárias, simplesmente o processo de licenciamento ambiental, um grande avanço do passado, não consegue mais cumprir sua função, sendo encarado pelas empresas como uma burocracia, um entrave ao desenvolvimento e não como um instrumento de planejamento preventivo, de tomada de decisão sobre algo que vai afetar a tudo e todos.
Todo dia aparecem propostas de “flexibilização” tentando diminuir o controle do estado e da sociedade, órgãos licenciadores e fiscalizadores são estrangulados e pressionados por uma administração mais política do que técnica, as empresas com mais recursos conseguem colocar seus interesses acima dos coletivos e a contornar qualquer “entrave”, enfim precisamos rever as normas e garantir maior controle da sociedade na tomada de decisão sobre nosso país.
Algumas destas propostas já foram aprovadas como o PL 2.946/2015 de Minas Gerais e outras caminham a passos largos como o PLS 654/2015 que tramita no Senado Federal, provando que nada é tão ruim que não possa piorar, este último, além de excluir a participação da sociedade prevê a aquiescência dos órgãos envolvidos que não se manifestem em um curto prazo, ou seja, se não conseguirem responder qualquer motivo o licenciamento será aprovado. É o oposto do princípio da precaução.
Apesar de todo este problema estrutural, nem tudo está perdido. Felizmente temos pessoas responsáveis e preocupadas na sociedade, no poder público e na iniciativa privada que muitas vezes heroicamente e geralmente no anonimato, conseguem fazer o que correto, não porque são obrigadas, mas simplesmente porque sabem que é o certo. Creio até que estas pessoas corretas são a maioria e só precisam ser valorizadas, precisam acreditar que sua atitude faz sim a diferença e não desanimar com qualquer pequena derrota. Que a tragédia de Mariana não desperte desejo de vingança, mas que cada um possa reavaliar seus valores, sua responsabilidade e que consigamos partir para ação!